Mostrando postagens com marcador jornalismo. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador jornalismo. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 16 de março de 2010

O sequestro de embaixadores

O trabalho jornalístico deu ao sequestro de embaixadores uma amplitude maior do que qualquer outra ação da luta armada. Desse modo, O Globo noticiava os sequestros dando a noção de um ato político contra o governo. Isto significa que as matérias foram editadas no primeiro caderno, ou seja, entre as páginas 2 e 7.
Diferentemente das ações da guerrilha em outros países da América Latina, os guerrilheiros brasileiros não exigiam dinheiro e sim a libertação de companheiros presos e torturados pela ditadura. Isso realçou o caráter idealista das ações armadas da esquerda brasileira.
Outro fator que contribuiu para a amplitude que tomaram os sequestros foi o fato de ter acontecido nos principais Estados do país, isto é, Rio de Janeiro e São Paulo.
Enquanto toda a população tinha suas atenções voltadas para a escalada brasileira rumo ao tricampeonato de futebol no México, um grupo da VPR – ALN sequestrou o embaixador da República Federal da Alemanha. Assim, O Globo destacou: “Terror sequestra embaixador da Alemanha”. Mesmo o texto não apresentando o substantivo terrorista para qualificar os autores do sequestro, o titulo já deixa evidente a tentativa de deslegitimar a ação guerrilheira1.
A deslegitimação da ação se fez presente também na edição do dia 15/06/1970. O Globo destacou a matéria: “Seleção brasileira repudia ação terrorista”. O texto apresenta um telegrama do chefe da delegação brasileira de futebol na qual ele desprezava a ação. Certamente esse telegrama surtiu grande efeito na grande massa. Nesse sentido, o telegrama contribuiu para a deslegitimação da luta armada. 2

quinta-feira, 4 de março de 2010

Adjetivos para qualificar a luta armada

Na matéria publicada no jornal O Globo em 22 de dezembro de 1969, “estourados mais quatro ninhos de terroristas”, notamos a influência ideológica do autor ao desqualificar a guerrilha, pois quem mora em ninho é bicho. Além disso, a palavra terrorista foi largamente utilizada para desqualificar as ações armadas e, consequentemente, justificar as ações violentas do governo.

Em outras ocasiões O Globo também demonstrou em todo o momento deslegitimar os guerrilheiros. Após o assassinato de Carlos Marighela, ele noticiou a “eficiente” ação do Dops para o assassinato do chefe do “bando terrorista”.

Em alguns casos, para expressar uma noção de verdade absoluta, a imprensa utiliza mecanismos objetivando silenciar determinados atores sociais e, com isso, apresentar uma verdade oficial dos fatos. Desse modo, a posição e a página ocupadas pela notícia tentam silenciar a natureza política do ocorrido1.

Acusado de denunciar Merival Araújo, sob tortura na sede do DOI – CODI, na Rua Barão de Mesquita, quatro tiros mataram o professor de história Francisco Jacques de Alvarenga no colégio Veiga de Almeida em 1973. A ALN assumiu a responsabilidade pelo justiçamento. Na morte política do professor, O Globo noticiou a chamada da reportagem ao lado da notícia de um ato terrorista na França. Assim, fatalmente o leitor fará uma associação entre um fato e outro. A reportagem ficou exposta na mesma página que os crimes comuns. Dessa forma, o jornal articulou as reportagens buscando silenciar a natureza política do ocorrido.

1 ABREU, João Batista de. As manobras da informação: análise da cobertura jornalística da luta armada no Brasil: (1965 – 1979). Rio de Janeiro. EdUFF. 2000. P. 151.



quarta-feira, 3 de março de 2010

O papel da cobertura jornalística na deslegitimação da luta armada no Brasil

A cobertura jornalística dos episódios contra o regime militar teve papel relevante para a legitimação e a consequente perpetuação do golpe civil – militar durante os 21 anos de sua vigência.

Nesse sentido, os órgãos de censura atuaram de maneira sistemática nas redações dos jornais objetivando silenciar qualquer matéria considerada prejudicial à manutenção do regime.

A polícia federal ficava com a missão de fazer a censura, orientada pelo ministro da justiça, ambos atendendo à diretrizes gerais do governo ou pedidos específicos1. Inserida como etapa regular no trabalho dos jornalistas, os assuntos censurados variavam conforme a conjuntura política.

Desse modo, ou se fazia o jogo ou sofria com a ação dos censores. Em entrevista concedida em 1997, o jornalista da revista Veja durante a ditadura Mino Carta afirma que o jornal O Globo jamais sofreu com a censura, pois eles faziam o jogo dos censores, ou seja, a empresa comandada por Roberto Marinho, desde o primeiro momento, posicionou – se a favor do golpe e da elite hegemônica que estava assumindo o poder junto com os militares.

Nas matérias jornalísticas, a linguagem assumiu fundamental importância para a demonstração da posição ideológica dos periódicos e simultaneamente a legitimação do regime através da manipulação da grande massa.

Assim, a palavra revolução foi fruto da disputa da esquerda e da direita. Dessa forma, o golpe civil – militar de 1964 foi chamado de revolução, o general Costa e Silva assumiu o “comando supremo da revolução”, já que através da história uma série de revoluções tornou – se legitima.

A esquerda também buscava a legitimação de suas ações armadas apoiadas na noção de revolução. Os grupos armados rotulavam – se revolucionários objetivando também o apoio popular.

Mesmo sabendo que a tomada do poder pelos militares não poderia ser uma revolução, pois todo movimento foi apoiado pela elite econômica, e ela para tornar - se cada vez mais hegemônica, precisava manter a natureza capitalista do Estado e, por isso, não poderia ser uma revolução, mas sim um golpe.

Em análises do período através de conversas informais com pessoas comuns, que viveram a ditadura sem nenhuma participação política, contra ou a favor ao regime, notamos que a palavra revolução ainda é presente ao denominar o golpe civil – militar de 1964. Ou seja, na batalha para a reconstrução da memória acerca do golpe, as pessoas que viveram aquele período ainda não conseguiram desassociar a revolução à ascensão dos militares ao poder em 1964.

O fazer jornalístico, podemos encara - lo como um ato de seleção da memória, pois ao selecionar o que vai ser escrito silenciamos parte do fato o que consequentemente cairá no esquecimento para a reconstrução do passado2. Nesse sentido, o fazer jornalístico é uma produção da realidade, que engendra sobretudo a questão de poder, já que a sua matéria – prima é a ideologia, onde a aparente imparcialidade é fundamental para a sua eficiência.

Corroborando o trabalho da grande imprensa e contribuindo para o posterior silêncio da memória, a ditadura divulgava uma lista de nomes de pessoas que não deveriam ser entrevistadas. Desse modo, após o A.I. 5, figuras como Leonel Brizola e Chico Buarque de Holanda foram silenciadas pelos órgãos de repressão da ditadura.

Assim, a estrutura predominante na época privilegiava a versão das autoridades sobre os mais variados assuntos. Com isso, a questão da tortura nos quartéis do exército aguardava as versões oficiais produzidas pelo governo, mas quando era impossível não mencionar as torturas, ela era atribuída a excessos dos subalternos3.

Na atribuição adequada para justificar os crimes de morte, os verbos aniquilar e eliminar eram largamente utilizados para legitimar as ações militares contra a luta armada4.

Já os grupos armados preferiam o verbo justiçar para justificar assassinatos de militares, policiais e empresários envolvidos na repressão, ou a morte de militantes acusados de denunciar companheiros. De acordo com Jacob Gorender, o justiçamento de companheiros teve um custo político altíssimo, mas este ato não deve ser entendido como vingança, a justiça revolucionária não se confunde com vingança5.

1 FICO, Carlos. Como eles agiam. Os subterrâneos da Ditadura Militar: espionagem e policia política. Record. 2001. P. 168.





2 PEDROSA, Lílian Maria Farias de Lima. Cidadania proibida: o caso Herzog através da imprensa. Imprensa oficial do Estado. São Paulo. 2001. P. 33.



3 ABREU, João Batista de. As manobras da informação: análise da cobertura jornalística da luta armada no Brasil: (1965 – 1979). Rio de Janeiro. EdUFF. 2000. P. 149.



4 Idem. P. 150.

5 GORENDER, Jacob. Combate nas trevas. São Paulo. Atica.2003. P. 282.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

A luta Armada

O projeto de luta armada para chegar ao poder é anterior ao golpe civil – militar de 1964. Porém, foi a partir do ato institucional n° 5 que a opção pela luta armada tornou - se a única alternativa de luta contra a ditadura militar. Apesar de haver dezenas de siglas e ideologias diferentes, grande parte das organizações da luta armada tinha em comum o leninismo, ou seja, acreditavam na inevitabilidade da revolução socialista.
Desse modo a consolidação da linha dura através do ato institucional n° 5 desmobilizou o movimento das massas e os partidos que ainda não tinham aderido à luta armada teriam que adotar. Dos grupos de esquerda revolucionária, podemos destacar a Ação Libertadora Nacional (ALN) e a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).
Acreditava - se que a enorme contradição das classes sociais existentes no Brasil levaria inevitavelmente ao socialismo. O que faltava era um grupo de intelectuais que estivessem à frente, na condução da sociedade objetivando o fim das desigualdades sociais.
Grande influência para a disseminação das idéias da esquerda foi o contexto internacional. As vitórias das revoluções cubana e argelina, a guerra travada pelo Vietnã contra os Estados Unidos e a revolução cultural chinesa impressionaram tremendamente a juventude politizada dos anos 601.
A vitória da revolução cubana também fez com que a teoria do foco guerrilheiro tivesse grande penetração na esquerda brasileira. Esta teoria consistia em estabelecer focos de guerrilha urbana e rural, desencadeados pelos chamados grupos de vanguarda. Esta corrente acreditava que os focos criados pelas chamadas vanguardas revolucionárias teriam condições de conquistar o apoio popular diante do suposto descontentamento com o regime militar implantado para manter a desigualdade social no país2.
Desse modo, podemos entender a luta armada como uma estratégia política fora dos padrões tolerados pelo contrato social vigente3.
A primeira reação armada ao golpe foi no sul com o ex – coronel do exército Jefferson Cardim. Grupos que estavam no exílio em Montevidéu somados ao chamado nacionalismo pequeno burguês, liderados pelo ex – governador gaúcho Leonel Brizola apoiaram a ação. Porém, a coluna guerrilheira participou de apenas três combates, sendo derrotada e seus integrantes condenados.
Mas foi a partir dessa ação que o grupo exilado em Montevidéu e os partidários do nacionalismo brizolista que surgiu o Movimento Nacional Revolucionário (MNR)4.
Desse modo, a reação armada no sul e o fortalecimento do movimento revolucionário chamaram a atenção do governo cubano no sentido de inseri-la na estratégia de revolução continental.
Após a desmobilização das ligas camponesas, as atenções cubanas voltam - se para Brizola e o MNR. O apoio acontecia na forma de treinamento guerrilheiro e em dinheiro5.
Assim, no estilo da guerrilha cubana, começou a formação de um foco guerrilheiro na serra de Caparaó. Situada na divisa da Bahia com o Espírito Santo, Caparaó reunia uma série de condições necessárias para o desenvolvimento da guerrilha rural. Já em 1966, 14 guerrilheiros chegaram à região, sendo que alguns haviam passado pelo treinamento guerrilheiro em Cuba.
A chegada dos guerrilheiros à Serra de Caparaó - outubro - coincidiu com a ida de Che para a Bolívia, em 19 de outubro de 1966 (entrou no país em 7 de novembro). O grupo de guerrilheiros preparados para implantar a guerrilha, que sublevaria o continente, partiu em grupos até dezembro. A escolha da Bolívia foi feita em março de 1964, por Guevara. Até dezembro de 1967 a luta armada irromperia em vários países da América Latina, inclusive no Brasil6.
Porém a aventura revolucionária, tanto a de Che na Bolívia quanto em Caparaó, durou apenas alguns meses. Logo aqueles homens embrenhados na mata chamaram a atenção da polícia e o receio da população local. Com isso, o fracasso de Caparaó decepcionou os cubanos e puseram fim às relações com Brizola7.
Já a partir de 1967, o governo cubano resolve apoiar o ex-integrante de PCB Carlos Marighela no projeto de revolução socialista no Brasil. Esse apoio foi concretizado na forma de treinamento guerrilheiro para os militantes das organizações de vanguarda armada8.
De acordo com fontes orais, os jovens de classe média tinham grande dificuldade de suportar os treinamentos físicos, enquanto que os ex-militares brasileiros tinham mais facilidade9.
De qualquer forma, o ato institucional n° 5 endureceu o regime e entre 1969 e 1972, ocorreram diversas ações de guerrilha urbana. Entre 1972 e 1975 foi identificado e destruído o foco guerrilheiro na região do Araguaia10.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Introdução

Apesar de já terem se passado algumas décadas, o golpe civil – militar e as esquerdas armadas ainda são frutos de grandes disputas entre atores sociais que viveram esse conturbado período da história do Brasil.
Na questão judiciária, atores sociais da época ou seus familiares ainda estão envolvidos em processos, na busca de ressarcimento financeiro, fruto da ação dos grupos políticos que tomaram o poder em 1964.
Atualmente persiste a enorme discussão acerca da abertura dos arquivos secretos desse período, ou seja, viriam à tona todos os culpados pelas atrocidades cometidas nos porões da ditadura e consequentemente descobririam a localização dos corpos dos desaparecidos durante o regime.
Mas é no campo da memória que esta relação torna-se mais conflituosa. Grupos sociais que ascenderam ao poder após a queda do regime, reconstroem seu passado a partir do que for mais conveniente em uma determinada conjuntura do presente. Sobre essa questão da memória aprofundaremos mais adiante.
É na legitimação e consolidação do golpe que os meios de comunicação terão papel relevante. A partir da década de 50 os jornais adotaram uma linguagem cada vez mais objetiva. Diante da crise gerada pelo alto custo do papel, a grande imprensa passou a adotar posições políticas cada vez mais definidas e isso foi determinante para o fazer político no Brasil contemporâneo.
No impasse provocado pela renúncia de Jânio Quadros, os grandes veículos de comunicação fizeram suas opções. Alguns se posicionaram em defesa da preservação da constituição, outros apoiavam a intervenção militar.
O jornal O Globo, fonte principal desse estudo, teve uma posição claramente contra a posse do vice – presidente de Jânio, João Goulart1, ou seja, a organização comandada por Roberto Marinho apoiava o projeto político – econômico dos militares.
Grandes embates ideológicos foram travados entre os jornais com o objetivo de conquistar a opinião pública, mas é após atitude de João Goulart com a revolta dos sargentos que a grande imprensa tendeu a uma convergência acerca do posicionamento político, desse modo, parte importante da classe média formadora de opinião começou a deslegitimar o governo Goulart2.
Em tempos de guerra fria, a ameaça comunista propagada pela imprensa com financiamento da elite dominante através dos órgãos do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), levava parcela da população a optar por uma posição anti – Goulart. Até o momento, a opção pela intervenção militar parecia ser a mais convincente.
Com isso, no período pré – 64, a grande imprensa, envolvida nessa campanha ideológica através IPES, apoiou o golpe civil – militar de 1964, tentando legitimar o seu projeto político através da estratégia de propaganda, convergindo a opinião pública à ideologia específica da classe dominante.
Com a consolidação dessa elite hegemônica no poder, veremos que a manutenção da opinião pública a favor do golpe se dará através do consentimento ou da repressão, isto é, alguns veículos de comunicação se colocaram claramente a favor da elite que estava no poder e os que não se submetiam a essa elite sofreram com intervenções e a repressão.
Nessa batalha, a linguagem assume importante papel na disseminação da ideologia dominante. Nesse embate, palavras como guerrilheiro e terrorista tornam - se antagônicas, quase antônimas para a repressão, e assume uma amplitude que foi capaz de qualificar o autor.
Visando dar contribuição a esse campo de pesquisa, este trabalho pretende analisar as diferentes linguagens adotadas pelos jornais conforme a conjuntura política da época. Para delimitar esse tema, optamos pela análise do jornal O Globo durante a vigência da ditadura militar, objetivando contrapô-la a uma linguagem do mesmo jornal na década de 1990, ou seja, no período pós-ditadura.
Nesse sentido nossa hipótese é verificar se há uma caracterização dos atores sociais envolvidos na luta armada contra o regime.
Para efeito de periodização, decidimos dividir o período militar em três fases, de acordo com certo consenso entre a maioria dos historiadores. A primeira fase inicia- se com o golpe militar e vai até a publicação do ato institucional número 5. A segunda fase compreende o período que vai do AI - 5 até a liberalização política, iniciada no governo Geisel, com a revogação desse ato. A terceira tem início no projeto de liberalização política, levada adiante por João Figueiredo3.